Tecnologias aliadas ao absurdo
Deep fake, propaganda, financiadores da ditadura, uma mistura indigesta
Hoje o tema da newsletter ia ser outro, eu já tinha até começado um texto sobre a relação entre a falta e o excesso. Mas o twitter interceptou minha mente me mostrando uma propaganda de uma certa marca de automóveis lançando a nova versão de um modelo específico que fez, ainda faz, muito sucesso no Brasil.
Esse comercial, que vi hoje no twitter, traz a Maria Rita e a mãe dela, Elis Regina, dirigindo e cantando dentro das 2 versões desse carro. Isso só foi possível graças a CGI, a IA e um infinito de outras siglas dessas tecnologias que tem criado imagens realistas de pessoas que já morreram (deep fake).
Dá pra dizer que ficou bom? Não dá. A Elis é mecânica e com pouca expressão, de propósito colocam a imagem dela mais de longe. A estética não é satisfatória, a dublagem mal feita, mas o problema maior está longe de ser esse: a música que elas cantam é “Como nossos pais”, criada pelo Belchior como música de protesto contra a ditadura. A letra da música é muito explícita sobre esse tema, de fácil interpretação.
Aí vem a mistura indigesta: a famosa marca de carros do comercial foi financiadora dessa mesma ditadura. A Elis e o Belchior sofreram os impactos de serem artistas no Brasil nessa época. E agora usam a imagem dela, com uma música dele, exaltando um carro de uma empresa que denunciava os próprios funcionários contrários ao regime e que já foi condenada por abertamente financia-lo.
Ao lançar uma obra, ao mostrar a outras pessoas e — especialmente — ao alcançar um certo nível de sucesso, artistas ficam suscetíveis a uma miríade de interpretações. Não é mais aquele pensamento que ocorreu ao criar, não são mais as experiências de vida e a temporalidade que exerceram suas forças sobre o ato da criação que ditam como uma arte será lida e entendida. Eu sei disso, você me lendo também sabe. Mas saber não tira a sensação de absurdo, o amargo na boca.
Precisava deixar registrado o quanto tudo isso me apavora.
Hora de respirar fundo, mudar de assunto, reparar na beleza desse bichinho que amanhã (5 de julho) completa 13 anos. Sou muito grata pela presença dele na minha vida.
Calendário
Nesse sábado, 8 de julho, tem oficina de bordado (a única desse mês) na Anelos, uma loja colaborativa que fica no bairro Navegantes, em Porto Alegre. A aula será das 14h às 17h30 e pode ser cursada por iniciantes e iniciadas em bordado. As inscrições estão abertas enquanto houver vagas.
Você que cursou oficina minha antes da pandemia e quer relembrar técnicas, especialmente quem fez o ‘bordando flores’ e achou muito conteúdo para apenas uma tarde: nessa nova oficina focamos nos pontos que as alunas escolhem, em um ritmo adaptado para cada turma.
Indicações
#1 YOUTUBE Eu amo acompanhar multiartistas e a Rachel é uma delas. Ela faz cenários e figurinos, filma e fala sobre os processos e registra tudo no youtube. É bem satisfatório acompanhar as aventuras dela, especialmente aquelas que envolvem costura de roupas de época.
#2 SITE Nesse último mês quis transformar algumas imagens em risco pra bordar ponto cruz e esse site foi perfeito pra isso. É só fazer o upload da imagem, dizer qual o tamanho do etamine (número de pontos da altura + largura da peça) e a quantidade de cores estou disposta a investir e ele fornece o gráfico perfeitinho.
#3 REPOSITÓRIO Esse site agrupa imagens (printscreen) de cenas de filmes. É o tipo de site que ajuda muito a quem tem dificuldade em fazer combinação de cores e também a quem quer aprender sobre luz e sombra para fotografia.
#4 INSTAGRAM Maëlys é uma ilustradora francesa que faz animações de cenas aconchegantes. É uma delícia observar cada criação dela e se transportar para aquele mundinho imaginário.
Tive até que me cadastrar aqui pois precisava comentar essa tua news. Maravilhosa!
E ótima oficina no sábado!